quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Nos últimos dias, têm saído várias notícias que dão conta de uma pressão, por parte de Bruxelas e do FMI, para que o governo português flexibilize a sua lei laboral. A necessidade de flexibilizar o mercado de trabalho aparece sempre associada à necessidade de fomentar o emprego. À primeira vista, a teoria parece pouco intuitiva: um despedimento mais fácil deve, se alguma coisa, aumentar o desemprego, e não diminui-lo. A chave está nos incentivos: como as empresas sabem que terão dificuldades em despedir nos momentos de recessão, para se precaverem não chegam a contratar nos momentos de crescimento, ou contratam menos empregados do que seria eficiente. Tornando mais fácil o despedimento, torna-se mais atraente a criação de emprego. Faz sentido, não faz? 

Por exemplo, se tornarmos mais fácil o divórcio, certamente que existe um maior incentivo ao casamento. Afinal, um divórcio fácil reduz o peso de desfazer uma má decisão, o que devia incentivar um maior número de casamentos. O divórcio foi permitido, em Portugal, a partir de 1975. Depois disso, o número de casamentos deve ter aumentado. Ou, pelo menos, não há-de ter diminuido. Segundo o INE, eis a evolução do número médio anual de casamentos em Portugal nas últimas décadas:


Então o que é que há de errado com a teoria? É que ela só tem em conta um dos lados. Quando uma empresa contrata alguém, não sabe muito bem se ainda precisará do empregado daqui a uns tempos - ou seja, não sabe muito bem no que é que se está a meter (e a noiva ainda menos). Esta parte é verdade, mas é só parte da história. Um empregado, sabendo que pode ser despedido sem qualquer dificuldade, estará necessariamente mais atento às oportunidades de emprego de outras empresas, e assim que alguém lhe ofereça mais dinheiro ele vai-se embora - afinal, o custo de ser leal à empresa aumentou dramaticamente com a possibilidade de, depois de dar tudo durante anos, a empresa o poder mandar embora. As empresas, para poderem manter a lealdade dos empregados, terão que pagar mais (ou seja, terão que fazer com que o custo de se ir embora aumente) e contratar menos. Um divórcio mais simples torna também menos credível o compromisso do casamento, pelo que as pessoas sentem que deixa de fazer sentido casarem-se - ou ficarem muito tempo no mesmo emprego. Isto é a base da teoria dos incentivos num contexto de assimetria de informação, que deu um nobel a Stiglitz e a Akerlof. O prémio foi em 2001, e o trabalho que desenvolveram é dos anos 70. Os conselhos para a flexibilidade laboral num contexto de alto nível de desemprego são actuais. Isto não quer dizer que a flexibilidade laboral não possa ser importante para alcançar uma maior eficiência económica, a prazo, o que me parece menos lógico é que ela reduza o desemprego, especialmente num momento de recessão económica. 

Publicado por Sílvio

Sem comentários:

Enviar um comentário